Papo de Varzea

Arquivo : dezembro 2013

Um dia na vida de um time de várzea
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Papo de Várzea

Amigos varzeanos, bom ano para todos!

Em velocidade de cruzeiro para aproveitar as férias, vou compartilhar com vocês um texto que o Gabriel Luccas mandou para o blog. Seria publicado em uma revista que nunca saiu do projeto. Mas é um relato interessante.

Um abraço!

Bruno Doro

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Leões em festa

À beira do campo da Sociedade Vila Sabrina quem dá o cartão de visitas é um torcedor aleatório. O copo de cerveja nas mãos e a feição de quem já havia tomado uns goles a mais aparentemente não o credenciam como uma fonte confiável. Mas a frase sim. “Esse time está invicto na competição. Até agora foram seis jogos e seis vitórias. Eu moro no Jabaquara, mas faço questão de acompanhar os jogos do Leões”.

Como não há arquibancadas, os torcedores ficam atrás do alambrado. O embate entre Leões da Geolândia e Ouro Negro, válido pela terceira fase da Copa Kaiser, conta com aproximadamente 100 pessoas. Desmembrando por ordem de interesse, a bateria, ininterrupta, fica por conta de 15 aficionados; a alegria do ambiente é compartilhada por outros 80 – entre parentes, amigos, torcedores e desavisados. Os cinco restantes não querem saber de bola. Estão compenetrados em uma emocionante partida de dominó.

Tudo parece interessante. Mas é de dentro do campo que realmente se sente o clima do futebol varzeano.

O artilheiro

Em meio aos truculentos atletas de defesa do adversário, o camisa 7 do Leões chama a atenção. Tininha, de 26 anos, é a principal opção de gols da equipe. O físico franzino parece desabilitá-lo ao sucesso, mas o número de gols marcados na competição (é o principal artilheiro do time) revela o cuidado a ser tomado com ele.

Contra a equipe do Ouro Negro pouco encostou na bola, mas marcou os dois gols da partida. O primeiro surgiu da trombada entre zagueiro e goleiro adversários. Com a meta vazia apenas empurrou para as redes. No segundo, na etapa final, recebeu a bola na entrada da área e chutou forte, à meia altura, e saiu para a comemoração.

Jogador de várzea está ‘preso’ ao time que joga ou pode torcer para um clube profissional? “Pode, sim. O meu é o Corinthians. Aqui (no time do Leões) visto o verde e branco, mas levo o preto e branco no coração!”. Quem vê a firmeza de Tininha ao falar do time de Parque São Jorge logo imagina que o atleta tem como ídolos Romário, Robinho, ou Ronaldinho. Ledo engano. “Não me inspiro em ninguém. Meu estilo é um só: jogo a bola na frente e ninguém me alcança na corrida”. A receita é simples, dífícil é pará-lo.

O Massagista 

Quem assistir às partidas do Leões da Geolândia certamente vai dividir a atenção entre o campo e o banco de reservas. Rivalizando com o bom futebol da equipe, Cícero Lopes da Silva – o “Ligeirinho”, se você preferir – é um dos que mais se desgasta durante os jogos.

Para saber a origem do apelido não é preciso muito. Ele corre para atender um atleta lesionado com a mesma volúpia de um atacante à procura do gol. Mas se o lance estiver parado dentro de campo, para ele nada muda. Está em constante movimentação – para orientar os jogadores, manter-se aquecido ou disfarçar o nervosismo.

Oficialmente é massagista e preparador físico do time, mas pode ser facilmente confundido com técnico, torcedor, psicólogo… “Faço tudo por amor. Aqui é uma grande família”. A arma secreta de Ligeirinho está no banco de reservas. Mas não veste chuteiras. De lá os jogadores não voltam do intervalo sem chupar uma laranja. Por quê? “Alimenta e o time não fica pesado. Laranja é o que não falta pra eles. Os adversários não usam isso e cansam mais rápido”.

Aos 57 anos, Ligeirinho diz não idealizar o futuro. Mas um sonho ele tem. “Queria ter um curso completo de preparador físico. Se não desse, um estágio com um profissional da área me realizaria”. Ele mesmo parece não acreditar na concretização do desejo. Pouco importa. O sorriso no rosto do pernambucano denuncia que ali está uma pessoa inteiramente feliz.

‘Estrangeiros’ 

Apesar de se tratar de futebol amador, o segredo para o sucesso na categoria é o “profissionalismo”, mesmo quando não há espaço para praticá-lo. Viver como jogador amador é um luxo. Treinar também. Com espaço de 15 dias entre as partidas, cada atleta exerce outra atividade profissional – fora do esporte. Por isso, não há ensaios. O time se junta às pressas e vai para o jogo.

Da equipe titular do Leões da Geolândia, sequer um nasceu na própria Vila Medeiros – a começar pelo treinador Nilton, nascido em Pirituba e dono de uma padaria na Vila Sabrina “O pessoal que joga aqui vem de fora. Eu e outros diretores observamos bons jogadores na várzea e tentamos trazer pra cá. Essa moçada recebe por partida”.

Para ajudar na estratégia de convencimento, há o forte apoio dos patrocinadores. “Só com estrutura conseguimos fazer uma equipe vencedora”. Com estrutura e com ‘ajuda profissional’. “Temos o apoio de muitos atletas. Os que mais ajudam são o Vagner Love (atacante da seleção brasileira), que inclusive já jogou aqui para nós, e o Nadson (ex-Corinthians)”. Exemplo desta ajuda chegará via Coréia, país em que joga Nadson. “Ele vai nos mandar uniformes novos, no valor de 6 mil reais. Pode até divulgar o valor”.

Divulgado.

Por Gabriel Luccas


Presente de Natal
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Papo de Várzea

Hoje é Natal! Sim, eu costumo dizer que é hoje, porque é no dia 24 mesmo que vem a ansiedade, é quando dá meia noite de hoje que a gente troca os presentes. Além disso, o feriado mesmo, amanhã, fica um dia morno, reservado só pro almoço em família. Mas e o presente? Já comprou o seu? Que presente você pediu ou vai dar para a pessoa querida? E para a várzea, que presente você daria para o futebol de várzea no seu bairro? Pense aí!

Semana passada, um vídeo começou a rodar no YouTube com uma galera da Zona Sul que deixou os seus desejos para o Papai Noel. Miguel “Carioquinha”, do CDC Bola Preta, pediu paz na várzea. Já Júlio Carlos, presidente do Arco FC do Jardim Consórcio, lembrou do cuidado com os campos. “Eu acho que os diretores desses belos campos podiam dividir melhor o tempo para outros times da região usufruírem do espaço”, disse Julião, como é conhecido.

Já o repórter Lucas Ribeiro foi mais saudoso. “Eu acho que podia acabar o capitalismo no futebol e a várzea ser mais como antigamente. Seria o melhor presente que podia acontecer”.

Por fim, Ari, um dos diretores do CDC Parque Fongaro Vila Arapuá, resume seu pedido de Natal para quem ama os terrões. “Acho que a várzea deveria voltar a ser mais várzea”. Ah é, o vídeo chama “Futebol de Várzea – Presente de Natal”. Assista e um feliz Natal.

 

 

Varzeanos ajudam Paraisópolis

Aconteceu o último encontro dos Amigos da Várzea do ano, que reúne diretores e adeptos dos principais times amadores de São Paulo. Na décima edição, as pessoas doaram alimentos e roupas, totalizando ao menos 100 quilos em itens que serão doados para a comunidade de Paraisópolis, zona sul. A equipe do Palmeirinha, dos parceiros Bruno e Chiquinho, será a responsável por receber a doação e repassar para a comunidade. O 10º Amigos da Várzea aconteceu no Centro de Treinamento KFC, em Itaquera, na Zona Leste.

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Varzeanos Solidários

Por Diego Viñas


De rejeitado a ídolo, goleiro Gylmar foi atacante na várzea
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Papo de Várzea

Ainda hoje, muitos jogadores profissionais admitem que sua formação aconteceu nos campinhos de terra. Não é preciso pensar muito para lembrar de Leandro Damião, Elias ou David Luiz, que nasceram no futebol de várzea e hoje brilham no futebol do Brasil e no mundo.

Antigamente, quando as escolinhas de futebol não existiam, a várzea era o celeiro de craques mais conhecido pelos grandes clubes. Na década de 1950, o Jabaquara contratou, quase que sem querer, um dos maiores goleiros da história do futebol brasileiro: Gylmar dos Santos Neves.

No início, Gylmar atuava pelo Vila Hayden, time amador da cidade de Santos, onde o futuro ídolo nasceu. Mas se pensa que o eterno camisa 1 começou embaixo das traves, engana-se. Usando o chute forte como uma de suas habilidades, Gylmar era atacante, atuando pela ponta esquerda. Teimoso, insistia atuar no campo ofensivo, mesmo com tantos amigos dizendo que ele era muito melhor como goleiro.

A estreia de Gylmar no Jabaquara, porém, foi desastrosa. O arqueiro titular do time santista, o grande Mauro (que tinha o apelido de “Fortaleza Voadora”),  se machucou e era a chance de vida de Gylmar contra o poderoso São Paulo, em pleno estádio do Pacaembu. Placar final, 5 a 1 para o Tricolor. Sim, um dos maiores goleiros que o Brasil já teve estreou no profissional deixando cinco bolas passar.

Foram seis meses para ser contratado pelo Corinthians. Mas não pelo talento. O time da capital queria mesmo era contratar o meia Ciciá. O time santista, no entanto, só aceitou negociar com uma condição: que levassem embora o “frangueiro” Gylmar. Deu no que deu.

Nascido na várzea e rejeitado na sua primeira chance nos gramados. Nada mal para quem se tornou bicampeão mundial pela Seleção Brasileira (1958 e 1962), conquistou diversos campeonatos paulistas por Corinthians (atuou de 1951 a 1961) e Santos (atuou de 1962 a 1969) e ainda levantou uma série de troféus nacionais. Além, claro, das inesquecíveis conquistas da Libertadores e do Mundial (1962 e 1963) ao lado de Pelé & Cia. no eterno elenco da Vila Belmiro.

Gylmar dos Santos Neves deixou os campos da vida em 25 de agosto de 2013, aos 83 anos, em consequência de complicações causadas por um AVC.

Por Diego Viñas