Existe receita para formar um time campeão na várzea?
UOL Esporte
Desde que comecei a cobrir o futebol amador pelo UOL, uma pergunta nunca foi realmente respondida. Como se monta um time vencedor? Cada pessoa tem uma teoria. Tem gente que vai para o lado da raça. Outro vai atrás dos mais experientes. Tem técnico que tem seus jogadores de confiança e os carrega sempre que troca de time.
O melhor resumo dessa história, porém, quem deu foi o goleiro reserva do Nove de Julho, Fernando (que foi um dos personagens do post de sábado, sobre o amor dos jogadores pela várzea): “Time forte não é aquele com as maiores estrelas. Mas aquele que se encontrou no meio da competição. Na Copa Kaiser o campeão nunca entra em campo com o mesmo time que mandou para o campo em sua estreia. Você precisa de um ou dois meses para avaliar a equipe, conhecer o nível físico e perceber quem está melhor naquele momento. Por isso, a Etapa 1 não vale nada. É a partir da segunda fase que o torneio começa de verdade”.
Acompanhei a campanha do Ajax, da Vila Rica, no ano passado, e vejo que essa visão da formação da equipe faz muito sentido. Mas vamos tentar explicar um pouco melhor o que ele está querendo dizer. No ano passado, o Ajax tinha recrutado o volante Gilmar Fubá, campeão mundial pelo Corinthians. Nas primeiras rodadas, ele era o dono do meio campo. Todas as bolas passavam por ele. Mas o time não encantava. Cheguei a ouvir comentários como “Não sei porque dão tanta atenção para ele. Bom mesmo é o XXXX”.
O nome de quem era melhor não importa. Torcedor é assim, cada um tem sua opinião. Mas eles estavam certos. Com Gilmar, o time era previsível – o jogador, brucutu entre os profissionais, se destacava na várzea, mas, exatamente por isso, era muito bem marcado. Na Etapa 2 (justamente a que começa neste domingo para o time da Vila Rica), o Lobão passou por dificuldades. Perdeu na estreia e, já sem Gilmar, as mudanças vieram. Time novo, alguns reforços e, ao fim do torneio, o título inédito.
Quer outro exemplo? Também no ano passado, o Adega, de AE Carvalho, montou um super-time. Trouxe uma série de destaques de outras equipes e um técnico de renome. Tinha até mesmo um atacante, Adauto, com experiência na Liga dos Campeões e campeão brasileiro, com o Atlético-PR. E foi eliminado precocemente.
Essas duas histórias mostram que, na várzea, é difícil prever como um time vai se sair. Sabe a química que os comentaristas tanto procuram nos times profissionais? Na várzea ela é ainda mais importante. Por duas razões principais: a origem do futebol amador é dos times de amigos, da galera da rua que se junta para desafiar bairros rivais. A mais importante, porém, é a falta de vínculo com a camisa que o atleta defende.
Hoje em dia, jogador troca de time com uma frequência muito alta. A cada ano, o técnico precisa olhar para seu elenco e descobrir quem são seus melhores jogadores, quem atua melhor em qual posição e que combinação é a mais adequada para o torneio. Além disso, existe a questão do entrosamento e o lado físico – não são atletas profissionais, nem todos tem o preparo físico necessário e o técnico só descobre isso colocando-os em campo.
No fim das contas, o time se encontra no meio da competição. Esse texto, aliás, não está aqui por acaso. Neste domingo, metade dos participantes da Copa Kaiser estreia na Etapa 2 da competição. Quem for a um dos campos, terá a chance de ver se o seu time já encontrou essa química. Se o grupo de atletas que começou a disputar no torneio já se tornou uma equipe.
Por Bruno Doro, repórter do UOL e responsável pelo Papo de Várzea