Quadrados, losangos e trapézios: várzea se vira em campos bizarros
UOL Esporte
Essa é mais uma matéria bem legal, publicada no ano passado, que merece ser relembrada:
Entre quadrados, losangos e trapézios, futebol de várzea se vira em campos bizarros em São Paulo
As regras do futebol são claras. Para disputar uma partida oficial de futebol é necessário um retângulo de 90 a 120 metros por 45 a 90 metros, com duas traves de cada lado. Mas, para quem joga futebol na várzea, tudo isso é relativo.
Pela cidade de São Paulo, jogadores amadores ignoram a formalidade e exibem categoria mesmo em campos com formatos bizarros. Quadrados, losangos, trapézios e até pentágonos, tudo vale quando a bola rola. Quem percebeu isso foi o jornalista José Ricardo Yoshiga Souza, que mostra sua pesquisa na página no Estrelas da Várzea.
Por lá, é possível conferir que campos importantes do futebol amador de São Paulo, como o Benfica, da Vila Maria, que fica entre as pistas expressa e do meio da Marginal do Tietê e recebe jogos da Copa Kaiser, o principal torneio de futebol amador da cidade, tem um formato “alternativo”: as linhas de fundo tem 69 metros e as laterais, 92 e 66 metros.
José Ricardo usa ferramentas simples para os cálculos: as imagens vêm do serviço de mapas do Google e ele usa um software de manipulação de imagens para limpar as linhas e calcular proporções. “A ideia era contar histórias que aconteciam na várzea. Foi quando entrei no Google Maps para ver quantos campos existiam para começar as visitas. Foi aí que vi um campo muito engraçado no Capão Redondo, todo torto e com medidas totalmente fora do padrão. Eu disse: achei o que eu queria”, lembra.
O projeto nasceu em 2010, após uma conversa de bar. “De tanto ouvir as pessoas falando dos grandes times, eu resolvi criar alguma coisa para lembrar da base do futebol, de onde muitos jogadores que hoje estão no topo saíram. Fiz uma pesquisa rápida e percebi que os assuntos da várzea eram tratado só como confrontos e resultados. Queria fazer algo diferente e engraçado. Lembrei de um amigo que era técnico de um time de várzea, substituiu um jogador, que ficou bravo e minutos depois voltou com um revólver na mão para tirar satisfação. É triste, mas engraçado. Queria contar essas histórias. Mas aí vi os campos e encontrei o foco para o projeto”.
Primeiro, o Estrelas da Várzea foi um blog, que segue no ar, mas sem atualização. Depois, migrou para o Facebook, mas o link está fora do ar. “As pessoas olham os campos, comentam e fazem sugestões. Alguns dos campos mais inusitados foram descobertos com essas dicas. E as pessoas que jogam nesses locais costumam gostar muito quando veem o seu campo em destaque”.
Um dos problemas que José Ricardo enfrenta é a atualização do serviço de mapas do Google. A maioria das imagens do Brasil não é atual. Principalmente porque, por projetos do poder público, muitos campos da várzea paulistana estão deixando de ser terrão para adotar a grama sintética.
“É um fenômeno muito rápido. Em um dos campos que visitei, achei que estava no local errado. Quando visualizei, era terrão, as linhas eram tortas. Ao chegar lá, já tinham passado um trator, levantado um muro, colocado grade, construído vestiário. A cada visita as coisas mudam. E ainda tem esse problema da grama sintética. Os terrões que ainda não viraram sintético, estão pleiteando a mudança. Eu não sou contra a grama propriamente dita, mas ao jogo de poder político que a instalação envolve. Você perde a essência das coisas”, reclama Zé Ricardo.
AS ESTRELAS OCULTAS NA VÁRZEA
Além da página sobre os campos, o projeto de José Ricardo resultou também em um vídeo sobre a escolinha Arco Verde, que funciona em um campo na Cidade Dutra. Lá, dois personagens, Gamela e Boreta, contam como suas vidas, e as das crianças da escolinha, são moldadas pelo futebol.
Gamela é o administrador do campo, que já desistiu de lançar craques. “Uma série de empresários aparece nos campos de várzea, promete mundos e fundos, conversa com as crianças, vai embora e nunca mais aparece. E ele contou que, se fala que o garoto pode virar jogador e, no fim das contas, não dá certo, a criança e a família da criança vão cobrar. Por isso, hoje ele sempre fala em formar pessoas”, diz Zé Ricardo.
Boreta é o zelador do campo. Ele que faz a manutenção do espaço, incluindo as linhas de marcação do campo. O processo é artesanal, a mão. E explica porque, pelo alto, os campos não são exatamente os retângulos perfeitos que a regra pede.
Ficou curioso? Assista o vídeo aqui: http://vimeo.com/41915087