Papo de Varzea

Vida de marajá? Veterano da várzea lembra perrengues no mundo árabe, incluindo mulher na coleira

UOL Esporte

Quando ouve que o craque do time foi para um time do “mundo árabe”, o torcedor logo pensa que o jogador viverá, nos próximos meses, uma verdadeira vida de marajá. Muito dinheiro, mansões gigantescas, carros luxuosos, uma verdadeira vida de rei. A realidade, porém, é muito diferente.

Rodrigo Piu, hoje veterano do futebol de várzea, sabe bem disso. Aos 32 anos, ele tem passagens por Emirados Árabes e Irã. E muita história para contar. A primeira foi logo em sua primeira experiência nas Arabias: “Quando eu cheguei no aeroporto de Dubai, não sabia nada sobre o lugar. Fui dar uma olhada e, no aeroporto mesmo, vi uma mulher com o rosto coberto e uma coleira no pescoço. A guia estava na mão do marido, que devia ser um sheik. Igualzinho a cachorro”, conta.

O choque foi grande. “Se ele podia fazer aquilo com a mulher, imagina o que eles poderiam fazer comigo? Um estrangeiro, que não falava a língua local, não conhecia os costumes. Pensei: ‘Estou perdido’”.

Não foi bem assim. Piu sobreviveu relativamente bem ao período. Tanto que, até hoje, considera o emirado de Dubai o local mais bonito que já visitou – e olha que, enquanto esteve por lá, viajou bastante para “esquecer a tensão”, incluindo passagens por paraísos da Oceania, como a Indonésia. “É de tirar o fôlego. Eles construíram uma praia dentro da cidade. Inacreditável”.

Mas nem tudo são flores. O pior da experiência é o calor. E o código de vestimenta que faz com que você sofra ainda mais com ele. “É muito quente. Durante o dia, você enfrenta 45, 50 graus. Todos os dias. E não pode usar pouca roupa, para refrescar. Bermuda é proibido. Camiseta regata, também. Você tem de estar de camisa com manga e calça durante todo o tempo. Mas você se acostuma”.

No Irã, a experiência também foi difícil. Ele foi contratado para jogar no Shahid Ghandi (que não existe mais), da cidade de Yazd, mas se contundiu no início de seu contrato. Ficou três meses em recuperação em Teerã. “Não conhecia ninguém e não falava a língua. Mas como todo ser humano, eu me adaptei. Em três meses, aprendi a falar farsi quase fluentemente”.

Recuperado, a experiência iraniana ficou positiva. Os brasileiros do time o acolheram e ele fez amizades com profissionais iranianos que trabalhavam no clube. “Todo mundo tem uma imagem muito radical do Irã. Do regime fechado, do fundamentalismo. Mas é bem diferente. É claro que a cultura é muito rígida e eles obedecem regras muito duras. Mas são, também, um povo muito acolhedor. O persa é um povo desconfiado, mas, depois que você conquista a confiança, ganha amigos para a vida inteira”.

Gostou tanto que, até hoje, diz que é o melhor país em que viveu. Além de Irã e Emirados Árabes, Piu também jogou na Itália e no Peru. Hoje, ele está jogando na várzea de São Paulo. É atacante do Pioneer, da Vila Guacuri, que está nas oitavas de final da Copa Kaiser. E joga no próximo domingo (às 13h), no campo do Nacional, na Barra Funda, contra o Família 100 Valor, do Jardim Panamericano.