O jogador que driblou um tanque de guerra
Papo de Várzea
O futebol de várzea é cheio de histórias legais de contar. Essa é de um dos jogadores que mais me impressionaram em um campo de terra nos últimos anos.
Conheci o Fabinho Prates em um jogo no gramado do Nacional, mas foi no campo do Americano, atrás do cemitério da Vila Formosa, em que virei um fã. Dominar o jogo, como ele domina, pareceu fácil na grama. Fazer o que ele faz no areião, porém, poucos conseguem.
A batida na bola é diferente. A visão de jogo, rara. Enfim, era um mistério ver um jogador como ele nos campos de várzea. Mas o Brasil tem dessas: muita gente boa tentando virar profissional e alguns acabam em caminhos alternativos. Ele é um desses. Aos 28 anos, já jogou por times de cinco países. Deixou o Brasil cedo, passou por Vietnã, Honduras, Bangladesh e, agora, Estônia.
“É claro que, como jogador, você quer ficar em um clube, se identificar com a torcida, criar uma história. Eu tenho esse sonho. Mas as experiências que eu vivi até agora foram muito enriquecedoras”, fala.
A mais marcante delas foi em Bangladesh. No fim de 2012, ele foi contratado para jogar pelo Brothers Union na B-League, a elite do futebol local. Em campo, a experiência não foi das melhores. Sofreu com uma contusão no tornozelo e voltou ao Brasil antes do fim do contrato.
Fora dele, viveu a experiência mais difícil de sua vida: teve de driblar, literalmente, um conflito armado, de cunho político, para chegar em casa. “Pouco antes de voltar ao Brasil, eu resolvi ir a um shopping, sozinho. Normalmente, eu ia com um colega, que vivia no país há mais tempo. Naquela vez, fui sozinho. Não deveria ter ido”.
Enquanto ele estava no shopping, um conflito armado surgiu na cidade de Dhaka, onde ele morava. O problema era político e remetia à guerra de independência do país, na década de 70. “Eram manifestantes gritando, fogo na rua e policiais atirando em quem tivesse passando. Tinha até tanque de guerra”, conta.
E Fabinho tinha de passar pelo local para chegar em casa. “Eu pedi a Deus: ‘Me ajuda. Ilumina esse carro para não acontecer nada’. Foi a situação mais dolorosa que já passei”. Como bom brasileiro, ele driblou o conflito. Passou pelo local em segurança. Uma semana depois, estava de volta ao Brasil.
“Todas as experiências que passamos na vida são positivas. Em Bangladesh não foi diferente. O futebol era muito forte, muito físico, pela presença de muitos africanos. Além disso, aprendi muito com a situação social do país. Era muita pobreza. Foi uma primeira impressão chocante, mas que nos faz crescer muito”.
Hoje, ele está em uma nova aventura. Quase tão inusitada quanto as anteriores. Seu empresário, Guilherme Ferreira, da Elite Squad, o levou para o Kalju, da Estônia. Na temporada passada, a equipe disputou a Liga dos Campeões – chegou até a terceira qualificatória. Neste ano, já está garantido na fase classificatória da Liga Europa. “Não é um país conhecido pelo futebol, mas o clube é fora de série. A estrutura é ótima e as pessoas me receberam muito bem. Principalmente o auxiliar técnico, o Getulio Fredo, que virou um segundo pai. O treinador principal, também, está me dando um suporte muito bom. Fui bem recebido do presidente aos companheiros de equipe”.
Até lá, vai Fábio terá tempo de se ajustar a um detalhe incômodo da Estônia: o frio. Ele chegou em dezembro ao país e, até agora, não enfrentou temperaturas positivas. “Já peguei menos 20. E a temperatura mais alta foi 2 graus negativos. Mas é um país preparado para isso. Você não deixa de fazer nada por causa do clima”.
A adaptação tem sido boa: ele já jogou três partidas pela equipe, sempre como titular. Na última marcou seus dois primeiros gols pela equipe, na goleada por 6 a 0 sobre o Paide Linnameeskondc.
Por Bruno Doro