Papo de Varzea

Ano de Copa. Vamos falar de Barbosa, o goleiro de 1950
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Papo de Várzea

Feliz ano novo, parceiro varzeano! Depois de duas semanas de descanso, em que o insuperável Carlão Carbone garantiu as nossas atualizações, vamos aos poucos voltando ao ritmo normal.

E, já que é ano de Copa do Mundo, vamos começar falando de 1950. Não é novidade que na primeira Copa do Mundo disputada por aqui teve um grande vilão. Quando o chute de Ghiggia entrou no canto esquerdo do gol da seleção brasileira, o goleiro daquela equipe iniciou um calvário. Considerado o culpado pela derrota, Barbosa ouviu acusações até morrer.

barbosa

É justamente sobre esse personagem que um dos grandes amigos que fiz no jornalismo, Bruno Freitas, resolveu escrever. Queimando as Traves de 50: glórias e castigo de Barbosa, maior goleiro da era romântica do futebol brasileiro, da Editora iVentura, é um daqueles livros que você lê de uma vez, curioso para saber o que reserva o próximo capítulo.

Mas, se você está pensando que essa é uma simples resenha do livro, engana-se. Toda essa introdução foi feita para contar uma história de Barbosa que envolve o assunto principal do nosso blog: o futebol de várzea. Você sabia que Barbosa, assim como Gylmar dos Santos Neves, começou na várzea jogando como atacante?

Essa história é contada em um dos capítulos do livro, “Antes do gol, vida de artilheiro”. Nele, Bruno Freitas conta os primeiros passos do então adolescente Barbosa no futebol. No ataque. Rápido e dono de um chute potente, ele era destaque por onde passava. Jogava na ponta direita, sempre marcando muitos gols.

A mudança para o gol aconteceu quase por acaso. Em 1938, ele era destaque do Almirante Tamandaré e foi disputar uma partida na Vila Maria. O goleiro do time, porém, faltou. Foi então que Barbosa ouviu a frase que mudaria sua vida: pode ir para o gol, “só dessa vez?” Ele aceitou. Acabou sendo o destaque da partida. Mesmo com apenas 1,77m, altura apenas mediana para a posição, ele aproveitou a agilidade e explosão muscular para a fechar as traves.

A partir daí, passou a jogar como goleiro também no time do Laboratório Paulista de Biologia, pelo qual foi tricampeão da Associação Comercial de Esportes Atléticos. Seu desempenho pelas equipes de várzea era tão bom que ele foi convocado para a seleção paulista de amadores. Disputou um torneio no Rio de Janeiro e levou a equipe de São Paulo até a final. Perdeu por 2 a 0 para a seleção do Rio, mas seu nome já estava sendo observado pelos times profissionais.

Em 1942, ele foi contratado pelo Ypiranga, começando uma carreira brilhante, infelizmente marcada pela final do Mundial, oito anos depois. Ficou curioso? Procure o livro. Vale, mesmo, a pena ler a história do goleiro. De quebra, ainda podemos ter um aperitivo do que pode representar uma Copa em seu próprio país.

Bruno Doro


Um dia na vida de um time de várzea
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Papo de Várzea

Amigos varzeanos, bom ano para todos!

Em velocidade de cruzeiro para aproveitar as férias, vou compartilhar com vocês um texto que o Gabriel Luccas mandou para o blog. Seria publicado em uma revista que nunca saiu do projeto. Mas é um relato interessante.

Um abraço!

Bruno Doro

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Leões em festa

À beira do campo da Sociedade Vila Sabrina quem dá o cartão de visitas é um torcedor aleatório. O copo de cerveja nas mãos e a feição de quem já havia tomado uns goles a mais aparentemente não o credenciam como uma fonte confiável. Mas a frase sim. “Esse time está invicto na competição. Até agora foram seis jogos e seis vitórias. Eu moro no Jabaquara, mas faço questão de acompanhar os jogos do Leões”.

Como não há arquibancadas, os torcedores ficam atrás do alambrado. O embate entre Leões da Geolândia e Ouro Negro, válido pela terceira fase da Copa Kaiser, conta com aproximadamente 100 pessoas. Desmembrando por ordem de interesse, a bateria, ininterrupta, fica por conta de 15 aficionados; a alegria do ambiente é compartilhada por outros 80 – entre parentes, amigos, torcedores e desavisados. Os cinco restantes não querem saber de bola. Estão compenetrados em uma emocionante partida de dominó.

Tudo parece interessante. Mas é de dentro do campo que realmente se sente o clima do futebol varzeano.

O artilheiro

Em meio aos truculentos atletas de defesa do adversário, o camisa 7 do Leões chama a atenção. Tininha, de 26 anos, é a principal opção de gols da equipe. O físico franzino parece desabilitá-lo ao sucesso, mas o número de gols marcados na competição (é o principal artilheiro do time) revela o cuidado a ser tomado com ele.

Contra a equipe do Ouro Negro pouco encostou na bola, mas marcou os dois gols da partida. O primeiro surgiu da trombada entre zagueiro e goleiro adversários. Com a meta vazia apenas empurrou para as redes. No segundo, na etapa final, recebeu a bola na entrada da área e chutou forte, à meia altura, e saiu para a comemoração.

Jogador de várzea está ‘preso’ ao time que joga ou pode torcer para um clube profissional? “Pode, sim. O meu é o Corinthians. Aqui (no time do Leões) visto o verde e branco, mas levo o preto e branco no coração!”. Quem vê a firmeza de Tininha ao falar do time de Parque São Jorge logo imagina que o atleta tem como ídolos Romário, Robinho, ou Ronaldinho. Ledo engano. “Não me inspiro em ninguém. Meu estilo é um só: jogo a bola na frente e ninguém me alcança na corrida”. A receita é simples, dífícil é pará-lo.

O Massagista 

Quem assistir às partidas do Leões da Geolândia certamente vai dividir a atenção entre o campo e o banco de reservas. Rivalizando com o bom futebol da equipe, Cícero Lopes da Silva – o “Ligeirinho”, se você preferir – é um dos que mais se desgasta durante os jogos.

Para saber a origem do apelido não é preciso muito. Ele corre para atender um atleta lesionado com a mesma volúpia de um atacante à procura do gol. Mas se o lance estiver parado dentro de campo, para ele nada muda. Está em constante movimentação – para orientar os jogadores, manter-se aquecido ou disfarçar o nervosismo.

Oficialmente é massagista e preparador físico do time, mas pode ser facilmente confundido com técnico, torcedor, psicólogo… “Faço tudo por amor. Aqui é uma grande família”. A arma secreta de Ligeirinho está no banco de reservas. Mas não veste chuteiras. De lá os jogadores não voltam do intervalo sem chupar uma laranja. Por quê? “Alimenta e o time não fica pesado. Laranja é o que não falta pra eles. Os adversários não usam isso e cansam mais rápido”.

Aos 57 anos, Ligeirinho diz não idealizar o futuro. Mas um sonho ele tem. “Queria ter um curso completo de preparador físico. Se não desse, um estágio com um profissional da área me realizaria”. Ele mesmo parece não acreditar na concretização do desejo. Pouco importa. O sorriso no rosto do pernambucano denuncia que ali está uma pessoa inteiramente feliz.

‘Estrangeiros’ 

Apesar de se tratar de futebol amador, o segredo para o sucesso na categoria é o “profissionalismo”, mesmo quando não há espaço para praticá-lo. Viver como jogador amador é um luxo. Treinar também. Com espaço de 15 dias entre as partidas, cada atleta exerce outra atividade profissional – fora do esporte. Por isso, não há ensaios. O time se junta às pressas e vai para o jogo.

Da equipe titular do Leões da Geolândia, sequer um nasceu na própria Vila Medeiros – a começar pelo treinador Nilton, nascido em Pirituba e dono de uma padaria na Vila Sabrina “O pessoal que joga aqui vem de fora. Eu e outros diretores observamos bons jogadores na várzea e tentamos trazer pra cá. Essa moçada recebe por partida”.

Para ajudar na estratégia de convencimento, há o forte apoio dos patrocinadores. “Só com estrutura conseguimos fazer uma equipe vencedora”. Com estrutura e com ‘ajuda profissional’. “Temos o apoio de muitos atletas. Os que mais ajudam são o Vagner Love (atacante da seleção brasileira), que inclusive já jogou aqui para nós, e o Nadson (ex-Corinthians)”. Exemplo desta ajuda chegará via Coréia, país em que joga Nadson. “Ele vai nos mandar uniformes novos, no valor de 6 mil reais. Pode até divulgar o valor”.

Divulgado.

Por Gabriel Luccas