Papo de Varzea

Vendedor de canoli do Juventus começou na várzea há 53 anos

UOL Esporte

“Vamos adoçar a boca?”

A frase, dita com uma simpatia ímpar, é tradicional em um dos espaços mais tradicionais do futebol paulistano. Antônio Pereira Garcia é o vendedor de canolis mais famoso da capital graças ao local em que trabalha: há 43 anos ele bate ponto no estádio do Juventus, na Rua Javari, para vender as iguarias.

O que poucos sabem, porém, é que seu Antonio é um varzeano nato. Ele chegou ao clube da Móoca aos 20 anos. Nos campos de várzea, ele vende seus doces desde os 10. “eu tinha dez anos quando comecei a trabalhar com doces. E sempre os canolis. Foi uma receita que aprendi com meus pais. E mantenho desde então”, conta.

Então um garoto de dez anos, ele cresceu andando pelos campos de várzea com o tabuleiro de canolis a tiracolo. “Eu sempre morei em Itaquera. Eu pegava o ônibus Carrãozinho-Parque São Jorge de descia na Rua Vilela, próximo ao Parque São Jorge. Passava pelo campo do Corinthians e por uma série de campos de várzea. Começava pela manhã e só parava perto das seis da tarde”.

Seu Antonio andava por campos tradicionais da várzea paulistana. Alguns ainda existem. Outros foram acabando, superados pela especulação imobiliária. “Naquela época, na marginal Tietê, era um campo atrás do outro. Trave com trave. Eu começava atrás do campo do Corinthians e vinha subindo. Tinha o Primavera, o Nova Neuza, o Benfica e o Flamengo, na Vila Maria. Do outro lado tinha o União dos Operários, o Ginástico Paulista. Todos à beira do rio, onde a várzea surgiu. Quando eram cinco, seis da tarde, chegava ao Anhembi, onde tinham mais de 40 campos de várzea”.

Em um dia, ele andava mais de dez quilômetros. Atualmente, ele está sempre nos jogos do Juventus, quando o Moleque Travesso joga na Javari. Além disso, segue rodando pelos campos de várzea, como o Americano, na Vila Formosa, ou o Lagoinha, na Vila Maria. Nos dias de semana, você pode encontrá-lo, todas as tardes em um atacadista na Vila Carrão, onde tem um ponto de venda.

A confecção dos doces é igual há 50 anos. “A receita é da minha mãe. E sempre vendi canolis. Nunca quis mudar. É uma massa a base de farinha, que é frita. E o creme pode ser feito com baunilha ou chocolate”, explica.

Ele também nunca fez outra coisa na vida. “Antigamente, eu vendia no Pacaembu, no Morumbi. Era só comprar o ingresso e vender nos estádios. Hoje, as coisas mudaram. As regras são outras e temos de respeitar. Além disso, a saúde não é a mesma, não dá para ficar subindo e descendo escadas” – no ano passado, seu Antonio ficou alguns meses afastados do campo. Ele teve sérios problemas cardíacos e acabou internado na UTI.

Mesmo assim, voltou a rodas atrás dos torcedores de futebol. A cada jogo do Juventus, cujos torcedores são sua principal clientela, vende 500 unidades do doce napolitano. Nos campos de várzea, a venda é menor, de 150 a 250 canolis por dia. “Minha mulher e minha nora ficam cozinhando o dia anterior inteiro antes dos jogos. Às vezes, eu saio para vender e elas seguem cozinhando, preparando o dia seguinte”.

Com tanto esforço, ele comprou casa, carro e ainda deu um bom futuro aos cinco filhos e 13 netos. “Mamãe e papai ensinaram que todo mundo tem talento para alguma coisa. Alguns são bons médicos, outros, engenheiros. Eu encontrei isso nos canolis”.

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